Faz exatamente dois meses que eu comecei a trabalhar como bibliotecária numa biblioteca pública. Estou ainda bem no início dessa minha nova carreira, ainda estou aprendendo. Mas agora já não fico mais apavorada toda vez que alguém se aproxima do balcão de informações e me faz uma pergunta. Ou quando o telefone toca (será que um dia some por completo esse pânico de falar em inglês no telefone?).
O meu trabalho consiste basicamente em ajudar as pessoas. Responder perguntas, indicar a direção de alguma sala (ou até do banheiro), encontrar algum livro (ou revista, ou jornal, ou CD, ou DVD), encontrar alguma coisa na internet, ajudar alguém a formatar um documento. Pode parecer coisa simples, nada desafiador pra quem trabalhava num escritório gerenciando projetos, equipes, clientes e orçamentos e agora atende o público. A diferença é que em vez de me estressar fazendo malabarismos com diversos projetos simultâneos e lidando com clientes muitas vezes exigentes e insatisfeitos, agora eu recebo sorrisos de gratidão imediatos, como o da moça de ontem que estava fazendo seu currículo e pediu minha ajuda pelo menos cinco vezes porque não se entendia com o Word. Ela foi atrás de mim antes de ir embora só pra me agradecer pela ajuda, se sentindo mal de ter me incomodado tanto. Lá dentro meu coração fica quentinho toda vez que eu percebo que o meu novo trabalho faz diferença na vida das outras pessoas, gente que não tem computador em casa, gente que não sabe navegar numa biblioteca pra encontrar o que precisa.
Eu não trabalho todos os dias. Sou bibliotecária auxiliar e trabalho em regime de sobreaviso. Basicamente cubro buracos da equipe fixa. Na maioria das vezes meus turnos são noturnos (de 5 às 9) ou no fim-de-semana. Mas pelo menos aqui é assim que se começa. Uma vez dentro do quadro de funcionários de uma biblioteca pública, eu posso me candidatar a vagas fixas que apareçam, até conseguir algo em período integral. Na verdade eu estou bem feliz que não trabalho todos os dias, assim tenho tempo para cuidar das meninas e levá-las nas atividades extracurriculares, tenho tempo para marcar consultas sem ter que faltar o trabalho, tenho tempo para fazer meus projetos pessoais. Eu trabalho pelo menos dois turnos por semana, cada turno dura 4 horas no mínimo.
E o tempo passa tão rápido! São raros os momentos em que fico à toa. Quando não estou atendendo alguém, eu tenho que pegar os materiais nas estantes que os usuários reservaram. Minha parte favorita! Amo perambular pelas estantes e acabo descobrindo tanto livro bacana, que minha lista de leitura só cresce. Também sou responsável por manter as “vitrines” abastecidas (há prateleiras de destaque, com as capas dos livros pra frente, geralmente os livros novos da coleção, ou um tema específico que queiramos promover). Se não estou pelas estantes e nem atendendo ninguém, eu leio. Há diversos manuais de procedimentos (principalmente protocolos a seguir em casos de emergência), intranet, revistas do mercado editorial (pra saber o que tem de novo nas livrarias). E quem não amaria um trabalho onde você pode navegar na internet à vontade? Não fico no Facebook, nem jogando, claro, mas leio blogs especializados em biblioteconomia, checo meu Twitter (que é basicamente profissional), e fuço meu Goodreads lendo sobre os livros. Afinal faz parte do meu trabalho estar bem informada. Eu vivo estudando o site da própria biblioteca, me inteirando sobre os eventos que estão pra rolar pra poder recomendar pros usuários, e até pra conhecer a montanha de recursos que estão disponíveis digitalmente. Mas, como disse, esses momentos são raros. Das 4 horas que passo no balcão de informação, eu não gasto nem 20 minutos na internet. Estou amando esse ritmo novo! Um dia nunca é igual ao outro, é tudo muito dinâmico, acelerado.

Qual profissão não tem seu estereótipo? (daqui)
Bibliotecário não faz só isso. Eu estou fazendo isso porque estou começando. Com o tempo, há outras atividades que podemos exercer, como planejar eventos, oficinas e aulas. Eu mesma vou dar uma aula de introdução à internet daqui a 2 semanas. Há outros que cuidam do acervo também, selecionando material novo para compra ou avaliando a circulação do acervo existente e tirando da coleção o que não é mais relevante. Há quem cuide da catalogação dos materiais (digo materiais e não livros porque também temos DVDs, CDs, revistas e jornais). Há quem cuide dos sistemas, do site, das licenças de banco de dados.
E os colegas de trabalho são pessoas maravilhosas. Super prestativas e generosas. Eu estou aprendendo tanto com eles! Geralmente ficam 2 pessoas no balcão, então até sábado passado eu sempre tinha alguém mais experiente que eu junto comigo. Como eu trabalho em 4 filiais diferentes e cada filial tem o seu jeito de fazer as coisas, e guardam as coisas em lugares diferentes, eu ainda ficava meio perdida quando alguém me pedia uma coisa e eu não sabia onde pegar, ou como usar o sistema pra encontrar o que a pessoa queria. Aí a colega (geralmente são mulheres) me ajudava, me ensinava. E os usuários, até aqui, foram sempre muito pacientes com a minha inexperiência. Ninguém nunca se mostrou irritado porque eu demorava demais pra atendê-lo. A cada dia eu me sinto mais à vontade e confiante. Já estou bem mais familiarizada com o sistema, com os tipos de pesquisa e como encontrar o que alguém procura.
O mais legal é interagir com as pessoas. Atendo desde crianças até idosos, de todas as classes sociais. Foi o máximo o dia em que tive que recorrer ao meu conhecimento de livros para indicar algum título de romance pra moça que queria ler Se eu ficar, da Gayle Forman, mas não tinha disponível na biblioteca naquele dia. Perguntei o que ela gostava de ler, sugeri alguns autores e ela acabou levando um do Nicholas Sparks. Ou quando uma mãe queria levar O diário de um banana pra filha de 9 anos e eu acabei recomendando outros livros semelhantes baseados no que a minha filha lê (ela também curte muito as peripécias do Greg Heffley).
Ainda tenho muito a aprender. É tão bom ter um trabalho em que parte da sua função é estar sempre aprendendo coisas novas. Um trabalho em que você compartilha conhecimento e informação com os outros. Eu já amava a biblioteca como instituição antes de trabalhar nela, como usuária apenas. E a cada dia vejo a importância dessa instituição na comunidade. É muito bom fazer parte de algo que faz diferença na vida de tanta gente.
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